segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Sobre Anna Kariênina...



Há muito tempo que já andava curioso para ler este romance do famoso Tolstói (Liev Tolstói).   Fato é que,pouco conheço sobre a literatura russa... assim, vinha esboçando uma tentativa de preparação (isso existe?), lendo alguns pequenos contos pingados aqui e ali. Tchékhov, Gogol... textos curtos, e que na verdade, não me causaram nenhum  frisson. Mais verdade ainda, só mesmo um “ah, tá.” Exceto um, que achei bem interessante ­-mas que infelizmente, não me recordo o nome, nem o assunto... Enfim, meu interesse pelos russos sempre foi moderado, nunca inexistente. Talvez os títulos e temáticas nunca me tivessem alcançado...

Mas Anna Kariênina, não... este sempre me intrigou e me atraiu para seus braços (ou garras, ou seja lá o que envolve com desconforto!).  cultivei uma certa apreciação pelo título, o nome é forte e misterioso. Fui descobrindo pouco a pouco sinais de uma vontade, até que uma leitura prévia, que me foi um grande achado, citava com frequência a obra. Pronto: fui mordido! Abocanhado, diga-se.

Não foi uma leitura fácil. Não é uma leitura fácil, creio eu. Primeiro, é um livro grande (sim, eu sempre conto o número de páginas). Segundo, é uma história com muitos personagens e lenta. E esta lentidão não me parece ser de todo despropositada. É, sobretudo, perturbadora... (calma, você vai entender o porquê).

Como bem alerta o prefácio, este não é um romance centrado na figura de Anna, nem focado, exclusivamente, na temática discutida pela personagem. Não, é antes um conjunto de temáticas, temáticas paralelas.

Anna kariênina é a bela esposa de um funcionário público russo (cargo de grande status na sociedade russa da época )e mãe afetuosa de seu filho Serioja. Sua figura é descrita de forma encantadora, assim como o seu impacto sobre os outros personagens. Envolta por uma gama de personagens complexos e de grande presença em todo o romance, Anna vai lidando gradativamente com o ônus de pensar e, principalmente agir, de forma transgressora aos olhos de uma sociedade conservadora e machista. Ela resolve sustentar o fim de seu casamento e o relacionamento com um conde. Até ai, você diz: cadê a graça? É justamente isso, não tem graça nenhuma! A minha impressão é que o autor nos coloca, utilizando a lentidão dos acontecimentos, numa angústia que só descobrimos juntamente com a personagem Anna, quando ela, numa catarse, percebe clara e angustiantemente a sua condição. O livro machuca neste momento!( aviso aos mais sensíveis).

                                                                     *

Parecia que o excesso de alguma coisa inundava seu ser e, a despeito da vontade dela, se expressava, ora no brilho do olhar, ora no sorriso. Intencionalmente a mulher apagou a luz dos olhos, mas a mesma luz cintilou, à sua revelia no sorriso quase imperceptível. “

                                                                     *

Ao mesmo tempo, liévin, um nobre senhor de terras, conduz a trama com outros questionamentos. Sobre o casamento (também) e outras questões filosóficas e socias. Liévin  queria se casar e pensava ser este um bom rumo para a vida de um homem. Este é um dos personagens principais, e que nos leva ao tédio, vez em quando.  Liévin é reflexivo e pessimista, boa parte do tempo. E esse é, muitas vezes (a maioria), o tom da narrativa. Somos levados, sem querer, sutilmente, a embarcar no estado de espírito dos personagens, e é ai que mora a angústia do livro.

                                                                  *

No tempo infinito, na matéria infinita, no espaço infinito, surge um organismo bolha, e então essa bolha se aguenta um pouco, rebenta, e essa bolha sou eu.”

                                                                 *

E é quando somos levados a sentir o livro e seus dramas, que redimimos a lentidão e as divagações agrícolas do romance.  É quando percebemos o soco que levamos sem que o tivéssemos notado, até o momento em que a ferida causada inflama.

No final, precisei de um tempo para respirar, “desintoxicar” e pensar sobre a trama. Gosto de romances reflexivos e fortes. Tive uma vaga lembrança de clarice Lispector no finalzinho do livro, sei lá... enfim, é uma obra que me deixou em guerra e paz com ela (trocadilho com outro romance do autor), mas que sem dúvida atingiu a sua proposta, me fez refletir, especialmente sobre as relações humanas  e, é claro, me deixou angustiado ( que aliás, foi a palavra campeã de repetição no texto... por que será?).

Para finalizar, deixo aqui um trecho de grande beleza, para que ninguém me acuse de chamar o livro de denso e angusti...

Serioja tinha nove anos, era um menino; mas conhecia a própria alma, era preciosa para ele e a protegia como a pálpebra protege o olho e, sem a chave do amor não deixava ninguém entrar em sua alma.(...)”